sábado, 28 de outubro de 2017

Notícia em primeira mão

Em uma questão de poucos segundos, toda minha vida havia passado, em câmera lenta, à frente dos meus olhos. Esfreguei a vista, enxuguei as lágrimas, olhei novamente aquele pedaço de papel que se estendia a minha frente: positivo. Uma única palavra, um resultado, e todas minhas certezas colocadas à prova. Nada fazia sentido, e, também, tudo ganhava uma nova forma: eu não precisava mais procurar o sentido. Ele estava ali. De repente, ele estava ali. Foram-se embora todos os questionamentos sobre o porquê o o quê, o pelo quê. A resposta estava ali: como numa resposta posta às claras numa prova escolar.

Lembrei de você. Deus, como eu queria contar a você. Pensei em todos os nossos planos, todos os nossos versos. Versos que, agora, escrevíamos a três. Pensei nos nossos pontos finais, vírgulas, três pontos... tudo o que havia nos levado até ali. Agora, seríamos três. Eu, você, ele. Ou ela. Sempre quis ela. Agora, não faz mais sentido. Ele ou ela. Seríamos três.

Peguei o celular, comecei a digitar uma mensagem. Não. Não se conta assim. Voltei à tela inicial, digitei seu número. Não. Não se conta assim. Queria, loucamente, desesperadamente, tortuosamente, ver você. Olhar bem nos seus olhos, sorrir e esperar que, milagrosamente, você entendesse o que meu coração queria lhe dizer. Como tantas vezes você já fez. Eu não tenho duvidas: o universo está ao nosso lado. Ele sempre esteve. Sempre estará.

Menos, claro, naquele momento. Quando desisti de te ligar e peguei a bolsa, saí trapaceando minhas pernas e resolvi ir te visitar. No trabalho. Até lembrar que, justo naquele dia, você não estava ali. Justo naquele dia, você havia viajado. E estava a alguns longos quilômetros de distância. Pior: em pleno voo. No avião. Longe de qualquer telefone celular. Longe de mim. De nós. Como era bom dizer isso: de nós.

Minhas pernas, de bambas, ficaram fracas. E tristes. Mas, de maneira alguma, eu deixaria de contar a você em primeira mão. Deixei-as desabarem em cima de uma cadeira qualquer, enquanto arquitetava a melhor maneira de te falar: agora, seríamos três. Agora, que finalmente havíamos planejado nossa viagem do final do ano, que havíamos especificado nossos orçamentos minuciosamente para os próximos meses, que havíamos, finalmente, escolhido a cor da parede que iríamos pintar na sala: agora, seríamos três.  E eu, que sempre gostei de tudo tão planejado, ao invés de enlouquecer, com, de repente, tudo tão diferente, só conseguia sorrir. Agora, seríamos três.

Resolvi voltar para casa. No caminho, compraria um sapatinho de bebê. Uma roupinha infantil. Uma plaquinha para colocar no pescoço de Ralph, nosso cachorro, onde estaria escrito que, a partir dali, ele não seria mais o dono do pedaço. "Promovido à babá de um lindo bebê". "Promovido à irmão". Promovido a qualquer coisa. Mil e uma ideias surgiram na minha cabeça, a cada passo dado. E elas, na verdade, pouco me importavam. Eu não queria planejar. Eu não queria nada planejado. Eu queria você. Ali, do meu lado. Pra te olhar e dizer: agora, seríamos três.

Cheguei em casa sem perceber. Não parei em canto algum para comprar coisa alguma, nada que fosse te dar a notícia. Cheguei sem perceber. Sorrindo para a chuva. Os canteiros. A porta do elevador. Resolvi subir, deitar um pouco, aquele calor estava de matar. Depois, sairia, decidiria as cores das paredes, do quarto dele, do quarto dela, provavelmente já teria comprado um enxoval inteiro antes mesmo que você voltasse. Até abrir a porta de casa. E ali estava você. Me olhando com um sorriso bobo. Como se, de repente, você já soubesse.

(...)

A vida prega peças. (...) A vida é quem dita as regras.]